Brevet
Randonneur Mundial de 600km de Porto Alegre do ano de 2006.
Largada em Porto Alegre e percurso cruzando
por Vale Verde, Passo do Sobrado, Pinheiral, Venâncio Aires, Mariante, Lajeado,
Venâncio Aires, Santa Cruz do Sul, Sinimbu, Candelária, Santa cruz do Sul e
retorno a Porto Alegre.
Clima chuvoso nos primeiros 400km de prova,
ou seja nas primeiras 20 horas de brevet que teve largada às zero horas de
algum sábado. Foi um brevet difícil com
tempo bom apenas no domingo. Muito vento na madrugada e muita chuva e frio. Pedalei
no grupo de ciclistas mais adiantado, sempre junto de amigos, Thales Moreira,
Roberto Trevisan, Paulo C. Endres, Rubens Gandolfi, Joel Scheren e Isac Ibaldo.
Outros ciclistas sempre estavam próximos, mas paramos no mínimo 7 vezes para
realizar trocas de câmara de ar.
Este teria sido o meu primeiro brevet de
600km. Em 2004 não havia ido a SP para pedalar o único brevet realizado neste
ano. Em 2005 também não pedalei o brevet de 600km, pois fiquei trabalhando para
que o meu irmão e sócio pudesse participar.
Em
2006 eu já havia decidido ir pedalar o Paris Brest Paris de 2007 e então
tinha a minha primeira oportunidade de me testar em um 600km.
Antes do brevet de 600km eu havia insistido
com o organizador para colocar horários de abertura e fechamento nos Pcs, pois
o mesmo era realizado no PBP e isto, na minha opinião, alem de facilitar a
organização, deveria ser uma aprendizado de disciplina para os participantes.
Então este brevet de 600km foi um dos primeiros no RS e ter horários de
abertura e fechamento dos pcs previamente definidos e divulgados.
O planejamento do nosso grupo era de pedalar
os primeiros aproximados 440 km do brevet, para dormir algumas horas/ minutos
no PC de Santa Cruz do Sul e retornar a Porto Alegre para completar os 160km
restantes e fechar os 600km. Os primeiros 400km foram de muita chuva. Os 36 km
de Santa Cruz do Sul a Candelária, já na noite de sábado, foram com muito vento,
que estava a favor para ir e contra para o retorno. Lembro como se fosse hoje
de encontrar o Edimar que vinha retornando e avisando, aproveitem agora, pois o
retorno esta muito difícil devido ao vento contra. Lembro como se fosse hoje a
nossa chegada a Candelária, antes do PC do CTG, de encontrar o Baltazar Braga feliz
nos esperando e dizendo palavras de incentivo. Lembro como se fosse hoje a sopa
preparada pelo Luiz da Rosa Gomes. Lembro de muitas coisas boas, mas lembro que
o Joel, ciclista local, me ofereceu pernoite na casa dele, bem próxima ao GTG
de Candelária. Aceitei o convite, pois tinha certeza que na manhã o vento teria
parado e seria mais fácil retornar a Santa Cruz para encontrarmos o nosso grupo
que estaria por lá.
Fomos a caso do Joel e tivemos que realizar
um arrombamento para poder entrar, pois não havia ninguém e a chave não estava
escondida no local combinado. Um banho rápido e foi para o sofá para dormir.
Combinamos o horário do despertar dos celulares. Era pouco antes da ½ noite e o
PC de Santa Cruz do Sul fechava as 6h da manhã. Combinamos de acordar as 2h
para podermos comer algo e seguir pedalando com calma os 36 km até o próximo PC.
O Joel não deve ter confirmado o horário do despertar no celular e eu coloquei
o horário errado= 5h. O fato é que o meu celular me despertou às 5h da manhã. Saímos
apressados, sem água, sem café, sem comer e com frio para percorrer os 36km
restantes em menos de 60 minutos a tempo de chegar no PC no horário. O Joel já
havia pedalado este mesmo percurso em um tempo recorde de 62 minutos e o meu
tempo recorde havia sido de 65 minutos.
Tínhamos
36 km a percorrer em menos de 60 minutos, largando frio, sem água e sem comida.
A favor estava o clima sem vento e o fato de havermos dormido mais de 5h. Os
primeiros 20km seguimos revezando a frente em um ritmo muito bom. Até representava
que seria possível, mas bastava olhar para o relógio para saber que não tínhamos
tempo e chegaríamos aproximadamente com 15 minutos de atraso no PC. Depois a
opção foi seguir em um ritmo mais apropriado e conversando sobre as opções na
situação. Não tem como descrever todas as hipóteses e pensamentos que tive
enquanto pedalava este percurso, então tento listas alguns pontos apenas.
Eu
era um organizador de brevet e um dos que mais brigada para que a modalidade
tivesse moralidade;
Eu
havia insistido e defendido a idéia de colocar os horários nos PCs;
Um
ciclista já havia sido desclassificado anteriormente por estar muito atrasado
na chegada ao PC;
Ficaria
muito chato eu pedir uma chance para o organizador;
Se
fosse desclassificado poderia seguir pedalando até POA e completar os meus
primeiros 600km, mesmo sem homologar, mas estava descansado e sabia que
chegaria lá antes do horário máximo das 40h, pois conseguiria pedalar a mais de
15km/h sem muita dificuldade. Isto não seria uma opção legal para o organizador
que teria me desclassificado, mesmo eu tempo completado os 600km antes do tempo
máximo do brevet de 600km. Isto estaria depondo contra a minha opinião da
necessidade de existir horários de abertura e fechamento dos PCs. Aqui vale uma observação= os horários definidos
não estavam corretos, mas a intenção deste texto não é reclamar e nem
justificar alguma decisão, mas mostrar um exemplo de como as informações
definidas devem ser respeitadas.
O
que eu poderia fazer? E o meu brevet de 600km? E todas as dificuldades enfrentadas
no dia anterior? E os meus amigos que estavam me esperando para pedalarmos
juntos? Sempre se tem o poder de
decidir, sempre é uma decisão também política. Feito! Uma luz brilhou nos meus
pensamentos ½ confusos. A melhor atitude a fazer era a de desistir do brevet de
600km ao chegar no PC com horário atrasado, mesmo que fosse por apenas 1 minuto
de atraso.
Chegamos
no PC de Santa Cruz do Sul, com mais de 15 minutos de atraso. Vários ciclistas
participantes ainda estavam por lá, alguns saindo para reiniciar a pedalada. A
maioria destes ciclistas estavam muito cansados, pois haviam dormido apenas
alguns minutos. A maioria destes ciclistas brevetou neste brevet de 600km.
Chegando no PC o organizador, meu amigo,
veio ao meu encontro, varias outras pessoas estavam ali, alguns que já haviam
desistido, voluntários, amigos. Olhei para ele, peguei o meu passaporte e
entreguei dizendo : estou desistindo! Ele me perguntou mais umas três vezes se
eu tinha certeza, sempre repeti que sim. Perguntei se tinha lugar na combi de
apoio para ir a Porto Alegre. O Joel perguntou se poderia continuar no brevet,
pois estava bem e conseguiria chegar no final antes do prazo. O organizador
respondeu que como ele havia chegado atrasado no PC estava desclassificado.
Nunca havia desistido, ou ficado sem
completar um brevet, por mais difícil e por mais dificuldades que houvesse
enfrentado. Não fiquei sem completar o brevet de 600km do ano de 2006 por estar
cansado, por ter dormido demais, por não ter tempo, mas sim porque queria seguir
as regras.
Vale lembrar que naquele tempo não existia
brevet de organizador e não tinha outro brevet no RS no calendário de 2006.
Vale lembrar que o meu primeiro brevet de 600km completado foi apenas em 2007 e
que neste mesmo ano completei o Paris Brest Paris 1200km.
Sabe
o que eu perdi não tendo completado o brevet de 600km de 2006?
Nada.
Sabe
o que descobri?
Existe
apenas uma classificação dos ciclistas que participam de um brevet. A classe dos
que completam e a dos que não completam o brevet. No caso eu não completei.
Muitas
vezes ficamos lutando, brigando e perdendo nosso tempo com coisas que valem
exatamente nada.
Apenas
para exemplificar recordo de outros fatos acorridos em um brevet de 400km
Santa Cruz do Sul em algum ano. Fatos que aconteceram em um mesmo brevet. Um
ciclista pegou carona com o carro da esposa
por 16 km, ficou muito irritado, pois pretendia ter o brevet homologado. Um outro ciclista
perdeu o passaporte do brevet, mas pedalou os 400km. Como organizador ofereci a
possibilidade de realizar a homologação, pois estava acompanhando o andamento e
tinha certeza que este ciclista havia pedalado os 400km no percurso e prazo do
regulamento, mas este ciclista recusou a possibilidade de receber, homologação,
medalha, ou certificado, pois não concordava em receber qualquer privilégio ou
tratamento diferenciado.
Luiz
Faccin
Abril
de 2015