quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Relato brevet 400km

Relato brevet 400 km da organização 29 de janeiro de 2011.
Sempre gosto de pedalar os brevet como organizador antes da sua realização, ou seja, antes da data oficial, mas neste brevet de 400km não foi possível pois estávamos no final de ano, época da farsa do papai Noel. Logo depois também não foi possível, pois estava no período santo das férias, das minhas é claro. Acho que a minha família merecia a minha presença mais do que alguma pedalada, ou homologação. O fato é que nos ultimo dia destas curtas férias eu iria pedalar o brevet 400km e o dia combinado era o dia 29 de janeiro.
Férias com chuva na praia e época de descansar e de relaxar também, ou seja, perder preparo físico. Voltei para casa dois dias antes do brevet marcado. Precisava guardar as tralhas, colocar as coisas em dia, mas também testar e decidir com qual bici pedalar os 400km. A opção normal seria a tradicional hibrida com câmbios e tudo o que se tem direito, mas eu queria pedalar o brevet 400 km com a bici de pinhão fixo, a série toda para ser mais exato. Durante o brevet normal realizado dia 08 de janeiro, eu, andando de carro, me imaginava em cada subida e decida pedalando com a fixa. De carro fiz tudo o percurso de fixa mentalmente: aqui eu freio, aqui em subo tranquilo, aqui, bem, aqui vou precisar caminhar algum tempo. Na verdade somente em dois locais eu tinha certeza que precisaria caminhar, mas estava de carro e com motor toda subida é leve. Não tinha certeza de como seria subir alguns trechos depois de ter pedalado 300km. Não sabia como seria estar em um sobe e desce continuo, ou às vezes apenas subindo continuamente por muito tempo. O meu medo era apenas de perder a paciência nas decidas por isto precisava estar bem comigo mesmo, ou seja, física e mentalmente bem preparado, sabendo que iria sofrer e que não podia ter ansiedade. Pensava em pedalar sozinho, pois é assim que pedalo no meu ritmo mais concentrado, ou hipnotizado. Queria ir sem ter ninguém como comparação que me obrigasse a ir mais rápido, ou lento, ou seja, 100% no meu ritmo. Teoricamente as vezes é assim, na pratica acho que nem sempre.
Vou de fixa, ou não vou? Pedalo os 400km ou não? Não estava com vontade de nada. A hibrida estava pronta. Já tinha pensado o que precisava fazer na fixa para pedalar os 400, mas precisava fazer algum teste. Adicionei a bici: bolsa tipo bagageiro Topeak fixa ao canote de selim, porta celular no guidão e freio dianteiro para a segurança nas decidas. Na sexta feira dia 28 resolvi pedalar com a fixa, para testar o freio, para testar a cabeça e ver se encontrava a vontade e coragem para enfrentar os 400 km. Para usar o freio precisava de uma longa decida e queria testar a cabeça subindo o asfalto novo para Herveiras. Fui pedalando tranquilamente até o inicio da subida e pensei em pedalar até onde fosse possível, mas às vezes tenho dificuldade para reconhecer o impossível, principalmente em cima da bicicleta. Fui subindo, subindo e encontrei uma desculpa para parar alguns minutos, fazer uma foto com o celular. Subi mais e encontrei algumas desculpas para não ir até o final: o horário para chegar a casa antes do almoço, a necessidade de não estar cansado para o dia seguinte, a opção de voltar para subir novamente, e já tinha muito a descer no retorno como opção de testar os freios. Cheguei em casa ½ dia e a decida com dois freios pareceu ser fácil, parecia estar fácil até sem usar os freios. Pedalei 87 km no dia anterior ao brevet de 400 e não estava decidido com qual bici ir e porque ir. Tinha combinado com a Lidiane, Jean e Gabriela e então estava na obrigação de ir até o local de largada.
Decidido ou não, eu iria com a fixa. Não estava bem e pensei em pedalar até Pantano e retornar, se fosse o caso iria depois à noite para verificar onde estariam pedalando os demais. Não sei por que queria ir de fixa, mas não tinha vontade de ir com outra. É com esta bici que estou acostumado a pedalar.
Largamos às 3h 31min no Posto Três Coqueiros já que na região do Hotel Feldmann esta tudo fechado neste horário. Teríamos que pedalar 2,5 km a mais. Fui o primeiro a chegar e logo chegaram as Lidi e a Gabriela. Avisei sobre a possibilidade de eu desistir em algum ponto pois estava desanimado. O Jean chegou em cima do horário e saímos. Por algum tempo pedalamos juntos e depois, eu e o Jean fomos à frente. Estava bom de pedalar com a temperatura nos vinte e poucos graus, lembrei-me das largadas geladas de outros brevets. Passamos por Rio Pardo às 04h30min. Até Pantano estava tranquilo e não estávamos tão rápidos, mas em um ritmo para ir longe. Não estava bem e sem fome, mas comi uma torrada e tomei um café na Raabelandia e resolvi ir até Encruzilhada. As coisas mudaram e as subidas suaves, mas longas, exigiram bastante. Amanheceu e o céu estava nublado, mas estava quente. De Pantano a Encruzilhada é quase somente subida, são apenas duas decidas mais significativas, o esforço com a bicicleta sem roda livre é grande. Chegamos no Posto Franck às 9 horas. O sol estava atrás das nuvens, mas prometendo aparecer com força. Comi outra torrada e estava me sentindo cansado. Bebi bastante e reabasteci as garrafas e reservatório. Liguei para a Lidiane e elas estavam a caminho. Vamos mais uma etapa até o bar e armazém Pereira. Os próximos desafios estavam no contorno de Encruzilhada onde existem quatro subidas e decidas. De carro eu imaginei que subiria pedalando, mas na hora iria pedalar até onde seria possível. Não estava fácil, mas não estava enganado e subi tudo pedalando. Logo depois a decida até o Arroio Peixoto com mais de 4 km. O vento contra alem de aliviar o calor ajudou a reduzir a velocidade e foi possível descer praticamente sem usar o freio. Mais uma subida e chegamos na parte alta e mais plana, o sol estava forte e o pneu traseiro estava murcho. Pedalei até uma sombra onde paramos para fazer a troca da câmara. Até o Bar Pereira não foi difícil, apesar de mais algumas subidinhas. Antes de chegar lá eu já sabia que iria pedalar até o Fita Azul- local de retorno e lembrava que sempre é mais difícil do que parece e de fixa nem poderia imaginar como.
Chegamos no Bar Pereira e fomos recebidos pela Diná e Dario. Levei algumas fotos impressas que fiz durante o brevet do dia oito. Fomos recebidos com carinho e já fui fazendo brincadeiras, na chegada já perguntei se tinha cachaça e que queria fiado. Ficamos lá por algum tempo e reabasteci água das garrafas, mas deixei o reservatório com pouco pois queria reduzir o peso. Saímos de lá 11h e 30 minutos. A decida do Abranjo não foi difícil, mas o Jean sumiu na frente e tive que usar o freio. Do Abranjo até o Rio Camaquã o percurso é fácil. Depois do rio tem mais alguns km sem subidas, mas depois é que começa o problema. O sol estava a pino, a temperatura próximo a 35 graus, o vento leve e contra ajudava a reduzir a sensação de calor. Estava usando camisa com proteção solar e que não transmite o calor para a pele e isto ajudava bastante, muito protetor solar na pele exposta. As subidas são longas e sem roda livre tinha que subir embalado e girando mais rápido, sentia que estava forçando os músculos das pernas, mas não sentia dor. Estava mais rápido que o Jean e às vezes parava para esperar.
Chegamos à sombra de uma arvore onde fizemos uma parada para descanso e refresco por alguns minutos. Chegamos à subida mais forte antes da Coxilha do Fogo e imaginava que ali precisaria caminhar. Estava pedalando, mas o Jean preferiu caminhar um pouco e eu também para não forçar preferi seguir caminhando. Na subida não tinha vento e caminhando também não existia o vento do movimento. Com o sol de rachar e o asfalto estava nos vulganizando, parecia que os pneus da bicicleta iriam estourar ou colar no chão. A minha água acabou. O Jean falou: quarenta e quatro. Eu perguntei: quarenta e quatro o que? Ele respondeu: quarenta e quatro a temperatura agora, o Polar esta pegando a temperatura do calor do asfalto também. Resolvi pedalar e esperei o Jean em uma parada de bus mais acima. A chuva estava por perto e preferíamos que estivesse ali. Estávamos muito lentos e a cada minuto o sol nos fritava mais, resolvi ir à frente e esperar o Jean no retorno. A água tinha acabado e as energias estavam acabando. O problema não era não ter roda livre ou as subidas, mas a fome. As minhas energias estavam acabando como o ar em um pneu furado. Cheguei me arrastando na BR 392 e o PC estava perto, faltavam 10 km. A tempestade estava perto e o vento estava forte e contra. Andei mais 2 km com dificuldade e cheguei a um bar, comprei 2 sucos e 2 garrafas de água e sentei no degrau. Ressuscitei e segui, agora só faltavam 8 km, o vento continuava contra, o sol forte apesar da chuva por perto, o acostamento ruim, tinha subidas e eu sem forças. Pedalava contando os quilômetros, 7, 6, 5, 4.5, 4, 3, 2, cheguei às 3h e 8 minutos.
Estava com fome e pretendia conseguir algum prato de comida, mas encontrei falta de vontade no atendimento e só lanche. Os pasteis estavam saindo e pedi dois. Sentei próximo ao ar condicionado e fiquei uns 20 minutos para devorar com dificuldade os pasteis, cada um parecia ter 1 kg de sal. O Jean chegou e ficamos por lá bastante tempo. Chegaram à dupla das duas doidas, Lidi e Gabriela, que acabaram saindo antes da gente. Fiquei esperando o Jean que havia tentado dormir, se arrumar. Aproveitei o tempo para reabastecer de isotônico o reservatório, de água as garrafas e comprar algumas bananas, balas e chocolate.
Saímos 20 minutos depois das duas e quase 18h. O retorno é mais fácil, ao menos até o Rio Camaquã. Nas decidas o Jean andava mais rápido e eu freava. Chegamos à subida logo depois da Coxilha do Fogo, agora depois da chuva, sem sol, a temperatura estava bem mais agradável. O Jean estava pedalando e depois resolveu caminhar e eu perdi o embalo e o giro porque a roda traseira estava solta. Demorei um pouco para reapertar os parafusos e disse para o Jean seguir em frente. Não demorou e estávamos juntos novamente. Não demorou e eu estava na frente e resolvi seguir para aproveitar o bom momento.
Estava pedalando sozinho. O giro dos pneus e do pinhão, a corrente fazendo a engrenagem girar, ou será o contrário? O pedivela movimentando as minhas pernas no ritmo dos pensamentos, da respiração e dos batimentos coração. Visão, tato e os sentidos em harmonia, ou tudo uma coisa só. A terra girando em baixo de mim, fazendo a estrada andar enquanto eu me equilibrava em cima das rodas. A única coisa que quebrou a harmonia foi a passagem de um comboio com sete carretas. Flutuando nos pensamentos sem pensar em nada alcancei a Lidiane e Gabriela depois do Rio Camaquã e segui no ritmo, um pouco mais lento devido ao relevo. Segui em frente e não queria perder tempo antes do Abranjo.
Chegando ao Abranjo fiz uma parada rápida para fazer uma foto ao lado da placa indicando a subida. Subi um pouco mais pedalando, mas a opção mais indicada era caminhar, olhei o horário 20h e 04 minutos. Caminhei até a inclinação menor e onde era possível pedalar durante 20 minutos e depois pedalei mais 10 minutos até o final da subida. Mais um pouco e estava no Bar Pereira e ainda era dia. Chamei o seu Dario e pedi se não tinha algum papelão para que pudesse deitar no chão, que estava molhado, mas já iria deitar embaixo de uma arvore, precisava descansar um pouco enquanto esperava os demais. O Dario voltou com uma cama de campanha com colchão e tudo e com a insistência acabei deitando para descansar, mas nada de dormir e não parávamos de conversar. Logo chegaram a Lidi e Gabriela que se sentaram no banco. O Jean chegou e foi logo deitando no chão. O Dario logo veio com um pelego e o Jean utilizou com satisfação. A sena ficou realmente muito estranha e lembrava um velório, dois grandões deitados, duas moças sentadas ao lado e um casal de idosos em pé por perto, tem coisas que nem com Master Card. Hora de ir embora pois faltavam mais 140 km, mas pedi para a Diná fazer um café e ela não demorou e retorno com um bule cheio. Reabastecemos as garrafas com água e saímos.
Eu estava com a camisa com proteção solar molhada de suor e a temperatura estava bem amena. Logo depois parei para colocar a capa de chuva de 1.99 para reduzir o frio. O tecido gelado estava me deixando realmente gelado. Seguíamos em um ritmo lento, mas para que pressa já que a noite estava agradável.
Chegamos a decida antes do Arroio Peixoto e eu fui freando, mas também larguei os pés do pedal para alongar as pernas. Agora tinha uma subida de mais de 4 km em linha reta com inclinação quase constante e que não era moleza para uma bici de pinhão fixo. Aumentei o ritmo para tentar facilitar a manutenção do giro e continuei. Os primeiros metros estavam fáceis, mas logo começou a esquentar. Sem ver o velocímetro eu imaginava a minha velocidade pela rotação dos pedais e sabia que estava próximo a 22 km/h. A escuridão não me deixava ver muita coisa alem da luz do farol e imaginava o quanto deveria ter andado. Um veículo vindo lá no alto iluminou a neblina e imaginei rapidamente que estava enfrentando um monstro. Enfrentava um dragão de 4 km que às vezes soltava bafo quente próximo à cabeça (a neblina iluminada no alto da subida). Eu seguia cortando o dragão a partir do rabo formando uma linha de corte que chegaria até a cabeça. O veículo iluminou novamente a neblina, agora mais próximo, e fez parecer que eu estava perto da cabeça. O veiculo passou e seguiu iluminando em direção à cauda. Nova escuridão e não demorou o dragão abriu a boca e soltou o seu bafo novamente, mas não consegui saber a distancia. Não foi fácil vencer o dragão e pareci ter levado um tempão, precisava fazer força com os braços e sentia que fazia muita força com os músculos das pernas.
Dragão vencido e parei em frente ao restaurante (fechado como sempre) para descansar e esperar os companheiros. Aproveitei para comer a ultima banana do estoque, beber água, alongar e sentar. Seguimos e logo depois era a hora de enfrentar as subidas e decidas do contorno de Encruzilhada. Segui mais lento na primeira decida, mais rápido na subida e já estava na frente dos demais. Na segunda ou terceira das subidas desembarquei da bicicleta e caminhei por algum tempo, terceira e ultima das caminhadas do percurso. Caminhando percebi que estava bem mais cansado do que na caminhada para subir o Abranjo. Mais um pouco e cheguei ao Posto Franck onde fui direto desembarcando, tirando capacete, mochila e luvas para deitar no banco e esperar os demais. Combinamos e acertamos com o pessoal do restaurante para deixar o café e as torradas com o frentista do posto- o horário do restaurante era até ás 22h. Comi as duas torradas, mas o café nem pensar pois foi colocado quente/fervendo, dentro de uma garrafa Pet que estava com o tamanho reduzido. O café tinha cheiro de plástico ( será o cheiro do BPA?). Peguei um pouco de água na torneira e vamos embora. O Jean estava andando rápido na decida e eu freando, mas porque estava com pinhão fixo. Já a Lidiane freava de medo do escuro. A estrada deserta e sem buracos e a Lidi com medo do que estaria na frente da claridade da luz do farol. O percurso de retorno a Pantano é muito mais fácil e as decidas são longas, de fixa se percebe melhor ainda isto, apesar do escuro da noite.
Chegamos à Raabelandia sem o Jean que ficou em alguma subida. Não podíamos esperar senão iríamos perder o brevet por atraso. Comi ½ sonho e tomei uma xícara de café preto. Reabasteci a água e saímos. O percurso na teoria não é tão difícil, mas o acostamento é ruim e o movimento de veículos é maior. Muitos carros saindo de boates, sempre em grande velocidade e com farol com luz alta.
Chegamos a Rio Pardo e o Dragão desta vez não era imaginação, mas o nome do posto de combustível. Fui direto à loja de conveniência e comprei três cafés. Bebemos o café que espantou o sono por algum tempo. O movimento estava maior em direção a Santa Cruz. Faltava uma subida grande com mais de 2,5 km, mais um dragão imaginário. Nada disto, mais um esforço, o ultimo grande. Depois do final da subida não restava muito e chegamos no pedágio – km 402 do percurso, às 5:45. A Lidiane quis ligar para a mãe busca-la. Ficamos esperando e eu deitei no chão e dormi por alguns minutos, até a sirene das 6 horas tocar no pedágio. Media pedalada: 21,9 km/h
A mãe da Lidi chegou e peguei uma carona até o Posto do Sapo, local da largada- seria km 416.
Pedalei até em casa, cheguei de dia. Fiz 413 km e completei 500km em dois dias com a bicicleta de pinha fixa.

Algumas fotos feitas com o celular.

E agora vem o brevet de 600, de fixa? quando? mas depois de algum descanso!

Luiz M. Faccin
02 de fevereiro de 2011

2 comentários:

Roger Ban disse...

" Visão, tato e os sentidos em harmonia, ou tudo uma coisa só..."

Tudo uno! Corpo e mente! Tudo intersendo e tudo caminhando, você transcendeu camarada.

Belo relato, só fiquei curioso com o Jean...

Namastê!

Monsieur Fixier Faccin!

Luiz M. Faccin disse...

Oi Rogerban!
O Jean chegou em Pantano e foi vencido pelo sono. Dormiu e depois retornou a Santa Cruz de bus.
Abraços