terça-feira, 27 de setembro de 2011

Relato Paris-Brest-Paris 2011- Rogério Carneiro

Tarde ensolarada de domingo 21 de agosto de 2011, temperatura na casa dos 30°C, eu e meu amigo Nilson estamos em Paris França, onde 6000 ciclistas aguardam o início da mais importante prova ciclística de longa distância do mundo o Paris-Brest-Paris, 1200 km de muita aventura.
Pelotões de 800 ciclistas partem a cada ½ hora, são 19:00 horas esta chegando nossa vez, um filme começa a passar diante de meus olhos. Estou agora com minha bicicleta sobre a linha de largada, últimos ajustes, uma invasão de pensamentos tomam conta de minha mente, pensamentos em Deus, na família, amigos, nos treinamentos, enfim preciso me conter para não chorar.
São agora 19:30 horas, inicia-se uma contagem regressiva recitada pela multidão, pronto, foi dada a largada para mais 800 intrépidos e “audaxiosos” ciclistas. Pedaladas rápidas e objetivas perseguem 02 batedores em possantes motocicletas cortando as ruas da cidade em meio a aplausos, gritos, palavras de incentivo,buzinas, música e muita euforia. Alguns quilômetreos a frente as motocicletas saem de cena, agora é fé em Deus e pé no pedal.
No pelotão um silêncio que dá arrepios, somente o som dos câmbios das bicicletas, apreensão misturada com sentimento de alívio passam a ser os companheiros de pedal.
140 km do local de partida chegamos ao primeiro posto de controle, uma multidão aguardando a chegada desses porque não dizer loucos ciclistas ou ciclistas loucos.
Uma grande estrutura com restaurante, banheiros, ambulatório, oficina de bikes a nossa disposição, parabéns afinal estamos na França realmente é outro mundo.
Uma vez alimentados vamos agora em direção ao segundo PC e assim sucessivamente até Brest onde pretendemos dormir algumas horas.
A pedalada esta sendo bastante agradável, alcançamos um pelotão de espanhóis e começamos andar no vácuo. Fizemos amizade rapidinho e já estávamos até puxando o pelotão. Era noite o pelotão estava andando numa média muito alta, 55 km/h para menos de 200 km percorridos. Acompanhamos este pelotão por 50 km e então resolvemos abandoná-los e tirar um pouco o pé, caso contrário poderíamos não alcançar nosso objetivo.
Alcançamos outros pelotões onde andávamos juntos, revezávamos e outras vezes apenas observávamos o jeitão dos europeus pedalarem. Fez uma noite bastante agradável e sem maiores surpresas.
Amanhece o dia e somos surpreendidos por pessoas a beira da estrada oferecendo café, bolo, biscoitos, sucos e água com uma grande alegria estampada em seus rostos. Paramos para fazer uma boquinha e ficamos mais uma vez surpreendidos com o tratamento, com o carinho em que fomos recebidos ainda mais quando dissemos que éramos brasileiros. Obrigado a todos os Franceses!
Não podia deixar de relatar aqui, quando em uma dessas paradas que fizemos para tomar um café a beira da estrada, uma dessas famílias nos mostrou um álbum de fotos onde apareciam crianças pequenas oferecendo café e biscoitos a um grupo de ciclistas participantes do Paris-Brest-Paris, e então nos falaram que aquelas crianças das fotos eram eles e agora adultos e já pais de família.
São fotos de cerca de 30 anos, ou seja, esta família acompanha o Paris-Brest por gerações isto é tradição para eles o que realmente me deixou boquiaberto. Merci Beaucoup!
Mais uma noite em cima da bike, frio, subidas e muito sono estávamos chegando em Brest, graças a Deus inteiros e com saúde.
Após 600 km chegamos em Brest bastante cansados, fomos direto para o hotel, mergulhei na banheira onde acabei dormindo, meu colega me acordou, fui para a cama e dormi 06 horas mas que pareceram 06 segundos. Acordei fui para o banho, tomei um belo café da manhã e em seguida partimos rumo a Paris felizes e contentes, pois agora todos os quilômetros percorridos são regressivos.
Alcançamos um pelotão de dinamarqueses e fomos orientados a não pedalarmos no meio do pelotão, ou pedalávamos bem a frente ou íamos no vácuo. Um pelotão muito sistemático, onde não existia um revezamento, somente uma pessoa puxava os demais, pedaladas constantes e em silêncio, um pelotão onde todos tomavam água ao mesmo tempo é pra lá de sistemático.
Acompanhamos este pelotão por cerca de 60 km até o outro PC onde carimbamos nossos passaportes e nos alimentamos para repor as energias. Partimos juntamente com os dinamarqueses, mas alguns quilômetros a frente estes resolveram parar, talvez estivessem com algum problema, seguimos então com outros ciclistas fazendo um revezamento no pelotão.
Havíamos percorrido 700, 800 km e as demonstrações de fanatismo e carinho por parte das pessoas que assistiam a prova ao longo da estrada nos davam forças para continuarmos pedalando. Começamos a observar ciclistas dominados pelo cansaço dormindo a beira da estrada enrolados em mantas térmicas, em cima de muros, na grama e até mesmo havia um dormindo dentro de um buraco onde era possível enxergar somente os pés do pobre infeliz.
Estamos agora a cerca de 60 km de Paris, estamos pedalando sozinhos e revezando a uma média pontual de 45 km/h . Um ritmo enlouquecido, passávamos outros ciclistas como se estivessem parados não sei de onde tiramos tanta disposição, afinal já havíamos pedalado mais de 1100 km.
Após 74 horas e 55 min. chegamos em Saint-Quentin, aplausos, euforia, fotos, abraços e um sentimento de dever cumprido.
Agora é festejar, relaxar, trocar camisas, parabenizar a todos, agradecer a Deus e aos franceses por terem permitido a vivência de momentos que com certeza ficaram para sempre em minha memória.
Gostaria de mandar um abraço ao Erich de Santa Cruz do Sul que apesar de ter sua bike danificada conseguiu concluir com uma bike emprestada, um grande abraço a guerreira Lidiane com quem encontrei no aeroporto em Paris quando retornava ao Brasil, 2015 tem novamente, ao meu amigo Lazari que encontrei no Louvre, ao “Estrela” Faccin, obrigado pelas dicas foram muito úteis, ao pessoal de Bagé que representou muito bem a Rainha da Fronteira, sou de Bagé também, aos ciclistas de Curitiba que encontrei na chegada, ao Cézar do Rio, desta vez o parafuso aguentou , um abraço à Simone ao Alexander e a muitos outros brasileiros que participaram deste grande evento.
Um abraço ao meu amigo Homero que se dispôs a viajar até Paris para ser meu apoio em Brest, companheirão, e ao meu colega de pedal Nilson, é sempre um prazer pedalar contigo e espero ter muitas outras oportunidades de pedalar ao seu lado.
Muito obrigado, 2013 tem o London-Edinburgh-London e em 2015 o Paris-Brest-Paris espero poder participar se Deus assim quiser. Au Revoir!

Rogério G. Carneiro

Um comentário:

Rodyer Cruz disse...

Relato espetacular Rogério!!! Parabéns e nos encontramos por aí!!!!